Uma Divisão para a Câmara dos Deputados

2025-05-18

tldr: Proponho uma redistribuição dos assentos da Câmara dos Deputados que não aumenta a quantidade de cadeiras.

No último dia 6, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que aumenta o número de deputados dos atuais 513 para 531. O aumento é pequeno, apenas 18 - ou 3,5% como o relator notou, mas vem em meio a uma discussão sobre crise fiscal, mudanças em benefícios sociais, e, mais importante no meu ponto de vista, de aumento de poder do Congresso. O próprio relator aponta para o que eu quero falar, quando diz que "perder cadeiras significa perder peso político na correlação federativa e, portanto, perder recursos".

Qual o problema em aumentar o número de deputados?

Nos últimos 10 anos, a Câmara vem acumulando um poder cada vez maior sobre o orçamento nacional. Além do custo de "manutenção" de um deputado e seu gabinete, é importante pensar no impacto de segunda ordem. Hoje¹, cada deputado indica um simbólico valor de R$37,9M: com os 18 novos deputados, o aumento seria de singelos 682,2M!

Isso, claro, considerando que os congressistas não vão querer "perder recursos" e sem considerar os constantes aumentos nos valores de emendas. Também não falamos dos modestos valores de emendas de comissão (R$15,4 bilhões em 2024) e de bancada (R$ 8,5 bilhões em 2024), que com certeza virarão objeto de disputa para aumentar proporcionalmente ao tamanho da bancada (me cobrem em 2027). O custo real desse aumento parece mais próximo de 1 Bilhão do que de 100 Milhões de reais.

Enquanto isso, a casa entrega resultados insatisfatórios para a população. A Câmara tem perdido um tempo enorme discutindo projetos do seu próprio interesse, mas que interessam muito pouco ao restante do país.

• Já gastaram uma porção relevante de 2025 discutindo anistia para os golpistas de 8 de janeiro, e tudo indica que vão gastar ainda mais;
• Em 2024 se encarregaram de desidratar a reforma tributária incluindo uma série de isenções para setores com forte presença em Brasília, entre outras peripécias como cogitar seriamente não afastar um deputado réu pelo homicídio da vereadora Marielle Franco (para "passar uma mensagem");
• Em 2023 gastaram uma porção razoável do ano em 3 CPIs que não chegaram nem a aprovar um relatório final e numa série de quebras de braço com os outros poderes para proteger as emendas parlamentares.

O que podemos fazer?

Podemos começar não aumentando a quantidade de deputados.

Proponho aqui um exercício de redistribuir os assentos da Câmara, respeitando os limites constitucionais, mas também garantindo uma melhor aderência à distribuição populacional e mantendo o mesmo tamanho da casa.

Princípios

• Aproximar o melhor possível a distribuição populacional do último Censo disponível,
• Respeitar os limites constitucionais de no mínimo 8 e no máximo 70 deputados por UF,
• Manter o mesmo número total de assentos: 513.

Resultados

Essa proposta muda a composição da Câmara de forma que apenas o estado de São Paulo² fique subrepresentado. Hoje, quatro outros estados estão nessa condição: Mato Grosso, Amazonas, Santa Catarina e Pará. Com a exceção dos limites mínimos, a maior sobrerepresentação fica em 0,35%, contra os 1% do Rio de Janeiro hoje.

Todos os detalhes, dos dados usados às fórmulas e resultados, podem ser encontrados NESTA PLANILHA.

Essas são as mudanças propostas:

Como redistribuir os assentos

Vamos então ao procedimento. Em ordem, nós vamos fazer o seguinte:

1. Usando a população de cada UF segundo o Censo de 2022, calcular quantas cadeiras cada UF teria em uma divisão 100% proporcional,
2. Identificar quais UFs caem nos limites constitucionais e alocar seus assentos,
3. Considerando apenas as UFs que faltam, calcular o percentual da população que cada UF representa e alocar seus assentos³,
4. Distribuir o restante dos assentos para os estados "mais próximos de ganhar um"⁴,

1. Divisão proporcional

Essa parte é fácil: usando a população estimada pelo IBGE no Censo de 2022, vamos calcular quantos % da população vive em cada estado. Depois, vamos multiplicar esse percentual pelo total de cadeiras (513). Essa conta pode ser vista nas colunas D e H.

2. Limites Constitucionais

Nas colunas I, J e K, nós aplicamos os limites constitucionais. No total, 142 assentos são alocados dessa forma.

Só um estado é afetado pelo limite máximo: São Paulo vai de 113 deputados numa conta proporcional para 70. Já para o limite mínimo, temos 9 UFs afetadas: Alagoas, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Sergipe, Rondônia, Tocantins, Acre, Amapá e Roraima.

3. População remanescente e "quota proporcional"

Sobram 371 assentos para alocar de forma proporcional entre os outros estados! Nas colunas L e M nós calculamos a "quota" de cada um dos estados entre a população restante.

O Rio de Janeiro, por exemplo, tem 11,27% dessa população - o que lhe daria 41,8117 assentos. Como não existe "meia cadeira" na Câmara, o RJ recebe agora 41 deputados, deixando um "resto" 0,8117.

Aqui, sempre arredondamos para baixo, tomando a parte inteira do número como sendo a quota alcançada de deputados. Esse é o cálculo feito nas colunas N e O, que nos dá a quantidade de assentos e os restos para cada UF. O resto dessa quota será distribuído no próximo passo.

4. Distribuindo os últimos assentos para os maiores restos

Nosso arredondamento para baixo fez com que sobrassem alguns assentos. Dos 371, alocamos 361 - faltam 10. Para esse restante, nós vamos olhar os restos de cada quota (coluna O) e ordená-los do maior para o menor. Os primeiros 10 estados, que são os 10 "mais próximos" de completar a quota para mais um assento (coluna P), recebem um assento cada,

Retomando nosso exemplo do Rio, temos um resto de ~0,81, que é um dos 10 maiores! Assim, o Rio ganha mais uma cadeira, para um total de 42.

5. Está feito

Pra finalizar, agora nós juntamos as duas partes - quem bate e quem não bate nos limites constitucionais. Assim, dividimos os assentos de forma pragmática e simples, respeitando todos os nossos princípios. A divisão final é mostrada na coluna Q.

O erro de representação é reduzido, e apesar de haver "perdedores e ganhadores" em números de assentos, não mexemos na composição total do parlamento. Evitamos os custos associados a isso, além da inevitável discussão de novo aumento em 2030. Estabelecemos um procedimento transparente e consistente, que pode ser repetido sempre que necessário.

Não precisamos esperar mais 40 anos pra ter essa discussão novamente, nem contratar aumentos no custo do legislativo a cada 10 anos.

References

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